A cena passa-se em Cabo Verde, mais especificamente na Cidade Velha, primeira urbanização portuguesa nas ilhas, antiga capital do arquipélago e único Unesco World Heritage Site do país. Era a minha segunda visita ao local, e na rampa que descende para a aldeia quando se chega da Praia, vejo este cenário: junto ao altos muros que contêm as terras de resvalar para a estrada, uma pilha de pó de pedra negra e uma família que trabalha em qualquer obra menor. É fim-de-semana, a altura em que as pessoas tratam destes assuntos. Limpezas, pequenos trabalhos de manutenção, coisas que têm de ser feitas.
Achei logo a cena pitoresca. O contraste do branco dos muros com o negro da brita, do pó em pilha e da própria calçada assente que constitui a estrada e, claro, as pessoas, a família, um instantâneo de vida quotidiana, muito espontâneo. Geralmente sou muito tímido ao fotografar pessoas, costumo disparar de anca, e como já tenho uns anos de prática com essa técnica os resultados costumam ser aceitáveis. Mas neste momento, como ainda estava a uma certa distância, fotografei de forma regular: simplesmente levei a câmara à cara, enquadrei, ajustei os parâmetros e disparei. Foi um disparo rápido mas o diabo do “puto” estava atento, como aliás se pode ver na “chapa”, e reagiu.
“O sinhô não sabi que nã se deve tirar fotografias de pissoas sem a autorização delas?”. Disse-o de semblante carregado mas com uma ponta de brincadeira na entoação e naquela fração de segundo fiquei sem saber se estava a brincar ou a falar a sério. Bati-lhe uma continência e respondi: “Si senhô!”, enquanto a família, lá em cima, ia caindo do muro de tanto rir.
Artigo do blog Cruzamundos. Mais textos em http://www.cruzamundos.com/